“Termino o livro e fecho o computador sabendo que, por mais que os escritores escrevam, os músicos componham e cantem, o essencial não tem nome nem forma: é descoberta e assombro, glória ou danação de cada um." (LYA LUFT)

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Olá, meus queridos visitantes!

Estarei me desligando do blog (provisoriamente, à princípio), e, portanto, não postarei novidades nos próximos dias. Podem, contudo, continuar visitando-o, conferindo as postagens mais antigas, comentando... Enfim... sintam-se a vontade!

Abraços a todos!

Rafaela Santos

Sonda-me, Usa-me


Sonda-me, Senhor, que me conhece
Quebranta o meu coração
Transforma-me conforme a Tua palavra
E enche-me até que em mim se ache só a Ti

Então, usa-me , Senhor
Usa-me

Como um farol que brilha à noite
Como ponte sobre as águas
Como abrigo no deserto
Como flecha que acerta o alvo
Eu quero ser usado da maneira que te agrade
Qualquer hora e em qualquer lugar
Eis aqui a minha vida
Usa-me, Senhor
Usa-me

Usa-me, Senhor
Usa-me
Sonda-me,
Quebranta-me,
Transforma-me,
Enche-me,
E usa-me.

Aline Barros

sexta-feira, 3 de junho de 2011

O pequeno príncipe

À princípio, parece tratar-se de literatura infantil, mas, na verdade, a grande obra de Antoine Saint-Exupéry apresenta grandes lições de vida para todas pessoas de todas as idades. Um verdadeira obra-prima da literatura mundial que aprecio muito e da qual recomendo a leitura. Abaixo, um dos meus trechos favoritos do livro.


                                          
(...)
O princepezinho disse à raposa:
 - Eu procuro amigos. Que quer dizer "cativar"?
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa "criar laços..."
- Criar laços?
- Exatamente, disse a raposa. Tu não és para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E tu não tens também necessidade de mim. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...
- Começo a compreender, disse o principezinho. Existe uma flor... eu creio que ela me cativou...
(...)
...a raposa voltou à sua idéia.
- Minha vida é monótona... se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra.
O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...
A raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe:
- Por favor... cativa-me! disse ela.
- Bem quisera, disse o principezinho, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.
- A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer alguma coisa. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!
- Que é preciso fazer? perguntou o principezinho.
- É preciso ser paciente, respondeu a raposa. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, cada dia, te sentarás mais perto...
No dia seguinte o principezinho voltou.
- Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração... É preciso ritos.
- Que é um rito? perguntou o principezinho.
- É uma coisa muito esquecida também, disse a raposa. É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, possuem um rito. Dançam na quinta-feira com as moças da aldeia. A quinta-feira então é o dia maravilhoso! Vou passear até a vinha. Se os caçadores dançassem qualquer dia, os dias seriam todos iguais, e eu não teria férias!
Assim o principezinho cativou a raposa.

(...)
- Vai rever as rosas. Tu compreenderás que a tua é a única no mundo. Tu voltarás para me dizer adeus, e eu te farei presente de um segredo.
Foi o principezinho rever as rosas:
- Vós não sois absolutamente iguais à minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativastes a ninguém. Sois como era a minha raposa. Era uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Ela á agora única no mundo.
E as rosas estavam desapontadas.
- Sois belas, mas vazias, disse ele ainda. Não se pode morrer por vós. Minha rosa, sem dúvida um transeunte qualquer pensaria que se parece convosco. Ela sozinha é, porém, mais importante que vós todas, pois foi a ela que eu reguei. Foi a ela que pus sob a redoma. Foi a ela que abriguei com o pára-vento. Foi dela que eu matei as larvas (exceto duas ou três por causa das borboletas). Foi a ela que eu escutei queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. É a minha rosa.
E voltou, então, à raposa:
- Adeus, disse ele...
- Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.
(...)
- Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão importante.
(...)
- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa..."

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Tem que ter coragem

"Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama
e dizer uma coisa terrível, mas que tem que ser dita. 
Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama 
e ouvir uma coisa terrível, que tem que ser ouvida. 
A vida é incontornável.
A gente perde, leva porrada, é passado pra trás, cai. 
Dói, ai, doi demaais. 
Mas passa. 
Está vendo essa dor que agora samba no seu peito de salto agulha?
Você ainda vai olhá-la no fundo dos olhos e rir da cara dela.
Juro que estou falando a verdade. 
Eu não minto. 
Vai passar."

Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Pálpebras de Neblina

              Texto muito interessante e altamente reflexivo, como tudo o que é escrito por Caio Fernando Abreu, na minha modesta opinião de apreciadora dos escritos desse grande escritor. Um pouco longo - verdade!- mas vale a pena conferir até o fim.

  Fim de tarde. Dia banal, terça, quarta-feira. Eu estava me sentindo muito triste. Você pode dizer que isso tem sido frequente demais, ou até um pouco (ou muito) chato. Mas, que se há de fazer, se eu estava mesmo muito triste? Tristeza-garoa, fininha, cortante, persistente, com alguns relâmpagos de catástrofe futura. Projeções: e amanhã, e depois? e trabalho, amor, moradia? o que vai acontecer? Típico pensamento-nada-a-ver: sossega, o que vai acontecer acontecerá. Relaxa, baby, e flui: barquinho na correnteza, Deus dará. Essas coisas meio piegas, meio burras, eu vinha pensando naquele dia. Resolvi andar. Andar e olhar. Sem pensar, só olhar: caras, fachadas, vitrinas, automóveis, nuvens, anjos bandidos, fadas piradas, descargas de monóxido de carbono. Da praça Roosevelt, fui subindo pela Augusta, enquanto lembrava uns versos de Cecília Meireles, dos Cânticos: "Não digas 'Eu sofro'. Que é que dentro de ti és tu? / Que foi que te ensinaram/ que era sofrer ?" Mas não conseguia parar. Surdo a qualquer zen-budismo, o coração doía sintonizado com o espinho. Melodrama: nem amor, nem trabalho, nem família, quem sabe nem moradia - coração achando feio o não-ter. Abandono de fera ferida, bolero radical. Última das criaturas, surto de lucidez impiedosa da Big Loira de Dorothy Parker. Disfarçado, comecei a chorar. Troquei os óculos de lentes claras pelos negros ray-ban - filme. Resplandecente de infelicidade, eu subia a Rua Augusta no fim de tarde do dia Tão idiota que parecia não acabar nunca. Ah! como eu precisava tanto de alguém que me salvasse do pecado de querer abrir o gás. Foi então que a vi. Estava encostada na porta de um bar. Um bar brega - aqueles da Augusta-cidade, não Augusta-jardins. Uma prostituta, isso era o mais visível nela. Cabelo malpintado, cara muito maquiada, minissaia, decote fundo. Explícita, nada sutil, puro lugar comum patético. Em pé, de costas para o bar, encostada na porta, ela olhava a rua. Na mão direita tinha um cigarro, na esquerda um copo de cerveja.
E chorava, ela chorava. Sem escândalo, sem gemidos nem soluços, a prostituta na frente do bar chorava devagar, de verdade. A tinta da cara escorria com as lágrimas. Meio palhaça, chorava olhando a rua. Vez em quando, dava uma tragada no cigarro, um gole na cerveja. E continuava a chorar - exposta, imoral, escandalosa - sem se importar que a vissem sofrendo. Eu vi. Ela não me viu. Não via ninguém, acho. Tão voltada para a própria dor que estava, também, meio cega. Via pra dentro: charco, arame farpado, grades. Ninguém parou. Eu, também, não. Não era um espetáculo imperdível, não era uma dor reluzente de néon, não estava enquadrada ou decupada. Era uma dor sujinha como lençol usado por um mês, sem lavar, pobrinha como buraco na sola do sapato. Furo na meia, dente cariado. Dor sem glamour, de gente habitando aquela camada casca grossa da vida. Sem o recurso dessas benditas levezas de cada dia - uma dúzia de rosas, uma música de Caetano, uma caixa de figos. Comecei a emergir. Comparada à dor dela, que ridícula a minha, dor de brasileiro-médio-privilegiado. Fui caminhando mais leve. Mas só quando cheguei à Paulista compreendi um pouco mais. Aquela prostituta chorando, além de eu mesmo, era também o Brasil. Brasil 87: explorado, humilhado, pobre, escroto, vulgar, maltratado, abandonado, sem um tostão, cheio de dívidas, solidão, doença e medo. Cerveja e cigarro na porta do boteco vagabundo: carnaval, futebol. E lágrimas. Quem consola aquela prostituta? Quem me consola? Quem consola você, que me lê agora e talvez sinta coisas semelhantes? Quem consola este país tristíssimo? Vim pra casa humilde. Depois, um amigo me chamou para ajudá-lo a cuidar da dor dele. Guardei a minha no bolso. E fui. Não por nobreza: cuidar dele faria com que eu me esquecesse de mim. E fez. Quando gemeu "dói tanto", contei da moça vadia chorando, bebendo e fumando (como num bolero). E quando ele perguntou "porquê?", compreendi ainda mais. Falei: "Porque é daí que nascem as canções". E senti um amor imenso. Por tudo, sem pedir nada de volta. Não-ter pode ser bonito, descobri. Mas pergunto inseguro, assustado: a que será que se destina?

Vai passar...

 - Por Caio Fernando Abreu

Vai passar...
tu sabes que vai passar. 
Talvez não amanhã, mas dentro de uma semana, um mês ou dois, quem sabe?
O verão está aí, haverá sol quase todos os dias,
e sempre resta essa coisa chamada 'impulso vital'.
Pois esse impulso às vezes cruel,
porque não permite que nenhuma dor insista por muito tempo,
te empurrará quem sabe para o sol, para o mar, para uma nova estrada qualquer,
e, de repente, no meio de uma frase ou de um movimento 
te surpreenderás pensando algo assim...
"como 'estou contente outra vez' "!

Minha triste imperfeição

Foi buscando acertar que às vezes eu errei
Mas quem pode acusar sem tentar compreender
Quando saio sem regar violetas que plantei
A sede que causei me afogará
Sem pressa, sei que posso alcançar
Digam o que quiserem só uma coisa importa
Verdadeiro é meu amor
O sentimento foi real
Quando eu te entreguei
Tudo aquilo que há em mim
Pode até não parecer
Se o mal que há em mim
Faz doer o teu coração
Minha triste imperfeição
Será que conseguirei a bondade que sonhei
Estou sempre a tentar remover as pedras
Se desvio o olhar da mão em minha direção
Fecho os olhos para mim e para você
Não canso, não desisto de lutar
Ainda se tropeço só uma coisa importa

-Rosa de Saron